ainda disforme.
Nos dedos submersos
e distorcidos
navegaram ondas e marés,
na erosão perfeita da arte.
A sua voz, atravessou a noite
num grito heroico.
«As palavras pesam. Um texto nunca diz a dor das pequenas coisas» Graça Pires in Poemas escolhidos
Nas margens do meu rio
há uma enorme angústia,
uma sede intensa.
Tudo arde, até o leito do rio
emana labaredas
que queimam os peixes.
Do teu rosto
soltam-se gotas de suor
e o sal cava-te rugas profundas
nas entranhas,
que choram
o calor da terra, do mundo.
Um deserto aproxima-se.
Perdi a noção do meu espaço.
Tudo se transforma.
Fico imóvel como pedra.
Ao meu redor apenas silêncio
e o chão em brasa.
Neste mar imenso mergulho o meu olhar,
a minha sede, os meus sonhos, o meu silêncio.
A brisa marinha envolve-me, cálida, mas serena.
Sentada numa escarpa,
atenta ao vaivém das ondas
que, em espirais, rodopiam agitadas,
como numa dança, numa linguagem,
que desconheço,
sinto como que um convite a meditar,
nas minhas escolhas, nas minhas imperfeições.
No horizonte, o sol já há muito adormeceu.
Fico mais uns instantes,
até que um pássaro voa rasgando o céu nublado,
deixando-me só, a cismar.
Neste momento renuncio ao silêncio.
Apenas a voz do mar continua
entranhada em mim.
Foto: Hosny Salah - Pixabay